Já olhou para alguém e pensou que essa pessoa é velha demais para fazer certas coisas? Ou mesmo já pensou que seria melhor não usar determinada roupa pois você não tem mais idade para fazer isso? O sentimento, que pode ser confundido com preocupação ou com alguma forma de cuidado e proteção, na verdade esconde um preconceito. Seu nome é etarismo.
A
palavra, que ainda não é facilmente encontrada no dicionário ou nas conversas,
representa a intolerância
relacionada com a idade e é uma discriminação. Fran Winandy,
psicóloga e consultora na área de Diversidade Etária, diz que a primeira
manifestação de etarismo é a que temos contra nós mesmos.
A
especialista afirma que o preconceito pode se manifestar de diversas formas e,
quase sempre, de maneira sutil. A promoção do autojulgamento e,
consequentemente, o julgamento com outras pessoas como velhos demais para
alguma coisa. A relação discriminatória de empresas ao não selecionar pessoas
com mais de 45 anos para novos cargos. A falta de políticas públicas de
incentivo a diversidade etária, o que pode ser chamado de etarismo
institucional.
“É
o caso da aposentadoria compulsória, norma presente em algumas organizações que
obriga as pessoas com idade de se aposentar a saírem da empresa,
independentemente de sua vontade.”, pontual a especialista ao falar de uma
forma institucional de expressar o preconceito.
Preconceito mascarado com cuidado
Fran
cita também um modo menos comentado da discriminação: o etarismo benevolente.
“Ele ocorre quando a pessoa parece estar sendo gentil com o idoso, mas na
verdade essa gentileza pressupõe que este idoso não tem discernimento”,
comenta. A própria família pode, dessa forma, infantilizar as pessoas mais
velhas do núcleo familiar sem perceber.
“Um exemplo é quando eu proíbo a minha mãe, idosa,
de assistir ao jornal na televisão, por considerar “violento demais” para ela.
Outro é quando o idoso vai ao médico e só o cuidador se manifesta: todos os
sintomas são descritos por outra pessoa e o idoso nem é questionado. Como
estes, vários outros exemplos apontam para casos de depressão em idosos que são
tratados como crianças.”
Os
estudos sobre a discriminação de idade, contudo, são recentes. Segundo Fran,
pesquisas sobre preconceito etário no Brasil começaram no setor da saúde. O
etarismo nas organizações começou a ser estudado timidamente na academia, em
meados dos anos 90. O interesse foi crescendo com o tempo, possivelmente devido
os estudos internacionais. A pesquisadora acredita que o aumento de interesse
que deu nos últimos anos é reflexo das relações sociais.
É preciso furar a bolha para falar de etarismo
É
preciso evidenciar e combater ao preconceito e expandir o discurso para que
mais pessoas saibam o que o etarismo significa. Para Fran, estar inserida no
ecossistema da longevidade e do envelhecimento é falar sobre a discriminação
constantemente.
A
psicóloga, que possui um blog
especializado no tema, conta que participou recentemente de
alguns eventos importantes sobre o tema. O convite para a produção de uma matéria
do Fantástico e de um painel da Revista Marie Claire sobre
etarismo. A entrevista com alguns jornais e revistas sobre o preconceito na
pandemia. A participação de Fran nesses acontecimentos mostra que o assunto
está se expandindo.
O
que falta, para Fran, é um movimento unificado, com objetivos que ultrapassem
as fronteiras pessoais de quem lida com o tema.
“Já sabemos que o etarismo existe, e daí? O que
podemos fazer para atacar de frente esse problema? Eu tento fazer um certo
ativismo nas minhas redes, mas é um trabalho de formiguinha! E, como eu,
existem várias pessoas fazendo o mesmo, mas não há uma coordenação dos
esforços. Precisamos de algo maior!”
Fran
ainda pontual que o país está envelhecendo a passos largos e que, nesse
contexto, é inconcebível que não estejamos nos preparando para lidar com o
preconceito de idade.
“Por
exemplo, vamos pensar nas empresas. Não seria a hora de refletirmos como fazer
para que alguns benefícios sejam menos onerosos? Veja o caso do custo
assistência médica para quem tem mais de 50 anos: é proibitivo! Alguns países
já têm subsídios do governo para que sejam menores. E a contratação de
profissionais aposentados versus impostos? Será que não é possível pensar numa
alternativa criativa para isso? Pensar numa forma de flexibilizar os modelos de
contratação nas grandes empresas também é uma discussão que poderia enriquecer
este cenário”, completa.
E o etarismo no mercado de trabalho?
Quando
o assunto é o mercado de trabalho, é possível que todos os tipos de preconceito
relacionados ao etarismo sejam evidenciados. Desde os profissionais que não se
consideram mais aptos para exercer seu cargo, até a empresa que não os
seleciona pois não os considera capazes.
Segundo Fran, os dois pontos de vista precisam ser trabalhados. O primeiro aspecto, relacionados à empresa, é a compreensão de que trabalhar para romper as barreiras do preconceito não é um favor e sim uma necessidade. “Os benefícios da implantação de um programa de diversidade etária já foram comprovados em pesquisas: inovação, clima organizacional, engajamento, produtividade e resultados. Portanto, é importante quebrar as resistências da cultura organizacional”, reforça.
A
realização de um senso, assim como a análise das políticas e práticas etárias
da empresa podem ser o início desse processo de mudança. Em seguida, um
programa de sensibilização e depois de desenvolvimento sobre o tema, com
workshops, mesas redondas e debates. Fran acredita que a criação de indicadores
é outro aspecto importante e o detalhamento de ações. Dessa forma é possível
existir uma implantação de fato, como por exemplo o processo de seleção às
cegas e a criação de metas para as lideranças.
“O papel da empresa é fundamental nesse processo
porque se a diversidade, equidade e inclusão não estiver em seus valores,
dificilmente alguma mudança acontecerá.”
Para o profissional, lidar com o etarismo é um
processo
Já
para o profissional, reverter a situação se torna algo mais complexo, uma vez
que o esforço não depende somente dele. Além disso, como se envolver em debates
quando pode-se estar fragilizado pela vivência do preconceito? Para Fran, não é
fácil encontrar um tom que não seja agressivo ou excessivamente choroso quando
o problema envolve as suas condições sociais. Mas é possível lidar com o
preconceito.
“A
saída é estudar, aprender a lidar com novas tecnologias, procurar se expor de
forma criativa ou bem-humorada para chamar a atenção positivamente, investir no
autoconhecimento, na ampliação da rede de contatos e arriscar fazer algumas
coisas diferentes, como empreender, ainda que timidamente”, completa.
Estar
atento aos programas voltados para o público 50+ que são divulgados nas redes
sociais e nos sites das empresas que lidam especificamente com isso também é
necessário. Fran comentar que é preciso estar pronto para quando a oportunidade
surgir, mas, caso ela não surja, encontrar
novas formas de trabalho.
Romper as barreiras do etarismo é uma necessidade
O preconceito com a idade deve se tornar uma luta individual, pois também é uma condição que colocamos em nós mesmos. Fran diz que precisamos questionar e pontuar quando percebemos que alguém está sendo etarista.
“Parece uma coisa crítica demais, mas em geral as
pessoas não percebem que têm comportamentos etaristas.”
Para
a especialistas existes alguns aspectos que são fundamentais para combater o
preconceito. São eles:
- Investir
em autoconhecimento, para compreender, frente ao cenário e perfil pessoal
o que pode ser realizado de diferente.
- Aplicar
a atualização profissional: lifelong learning. O que seria
importante aprender ou aperfeiçoar para melhorar as minhas chances de
atingir meus objetivos?
Existem
diversas plataformas que oferecem cursos profissionalizantes para esse tipo de
atualização. O Instituto de Longevidade MAG é um desses exemplos e conta com as
melhores opções de especializações para pessoas acima de 40 anos. Com mais
de 300 opções de cursos gratuitos, se atualizar profissionalmente se
torna muito mais acessível.
- Dar uma
atenção especial a sua rede de contatos e ampliá-la pensando nesses
objetivos.
Fran
destaca que atenção especial não é sair pedindo emprego ou se lamentando: é
cultivar. Ela pontua que rever a forma de se apresentar nas redes sociais, as
publicações, compartilhamentos e participação em grupos também podem ser
incrementados. “Tente conhecer algumas pessoas através de um “café virtual”.
Ofereça-se para apoiar algum trabalho ou uma causa. Demonstre empatia”,
completa.
- Para
quem não está trabalhando, participar de algum trabalho voluntário pode
ser enriquecedora, além de ampliar a sua rede com pessoas do bem.
Além
de poder ajudar no treinamento de competências comportamentais interessantes.
- Manter
uma rotina que cuide da mente e corpo. Uma rotina de exercícios e momentos
de lazer devem ser intercalados com essa busca de objetivos profissionais.
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