Para muitos empreendedores, o processo de venda e
sucessão na empresa costuma ser doloroso. Minha experiência mostra que não
precisa ser assim.
O trajeto é conhecido: um empreendedor identifica um
problema, vê a oportunidade de resolvê-lo de forma inovadora, monta uma
empresa, cresce forte, recebe uma oferta irrecusável de compra (ou de fusão) e
decide aceitar. Até aí, nada de novo. São muitos os casos de gente que segue
esse caminho.
Mas, e depois? O que acontece? Do momento da sucessão —
que é delicado e super importante na carreira de qualquer pessoa que tenha
criado uma empresa — não existem tantos registros assim. Não existe uma
ferramenta, ou um manual específico com o que fazer e o que evitar. O que
existe é a experiência de cada empreendedor e o melhor que cada um pode se
prestar a realizar depois.
Como tive a oportunidade de viver essa situação, gostaria
de compartilhar alguns aprendizados e percepções que podem te ajudar a lidar
com esse momento de transição em uma empresa.
O negócio nunca é só seu
É comum me perguntarem como é que eu me “desapeguei” do
negócio que vendi. Para responder, costumo falar do início da Sieve: quando meu
sócio e eu criamos a empresa, tínhamos uma certeza – a de que o negócio surgiu
para resolver um problema claro e real do e-commerce. Assim sendo, nunca
tivemos essa percepção de que a Sieve era só nossa, porque também era dos
clientes cujos problemas queríamos solucionar (lojas virtuais e fabricantes).
Além disso, queríamos que cada membro do nosso time (os
Sievers) se sentisse feliz e motivado por trabalhar na Sieve. E, pra que isso
acontecesse, o compartilhamento da cultura organizacional tinha que ser total,
sem restrições. Ou seja, o negócio também era da nossa equipe.
Por isso, a questão do “desapego”, no meu caso, não teve
tanta importância. Então, minha principal orientação, aqui, é que:
VOCÊ, EMPREENDEDOR(A), DEVE TER CONSCIÊNCIA DE QUE SEU
NEGÓCIO É COMO UM FILHO. EM UM MOMENTO, VOCÊ É TOTALMENTE RESPONSÁVEL POR ELE.
MAS DEPOIS, ELE CRESCE, SE DESENVOLVE, SAI DE CASA… VAI PARA O MUNDO.
Chega o tempo em que o negócio não depende mais só de
você.
No nosso caso, como sempre tivemos essa mentalidade, nunca foi uma
questão delicada essa de vínculo muito estreito com a operação. Isso tornou
mais fácil e mais leve o processo de sucessão, tanto interno quanto externo.
Fizemos fusões e vendemos. Mas
continuamos tocando o negócio
Muita gente também se pergunta também sobre “o que fazer”
após a conclusão de uma venda. Quais os passos devem ser dados.
Novamente, não existe uma receita de bolo. Até porque
depende muito do momento em que a empresa está. No caso da Sieve, nós
continuamos tocando o negócio como executivos. A equipe e a operação continuou
sob nossa responsabilidade. A principal diferença é que, com a chegada de novos
sócios, o sonho grande aumentou.
Aliás, a questão do sonho grande, aqui, é super
importante, porque a minha orientação quanto aos próximos passos para gestores
que passem por essa experiência sempre será a de ampliar esse sonho grande.
Sempre digo para buscarem parceiros em linha com os seus valores e objetivos,
além de um modelo de negócio que permita que o sonho se expanda ainda mais.
Empreender não é só abrir uma
empresa
Por falar em sonho grande, quero propor uma reflexão um
tanto filosófica: para mim, empreender é muito mais do que abrir e tocar um
negócio.
É UMA ATITUDE DE VIDA, E QUE, POR ISSO, É INDISSOCIÁVEL
DO LEGADO QUE PRETENDEMOS DEIXAR.
Faço essa reflexão porque também ouço muitas perguntas
sobre como, depois de vender um negócio, o(a) empreendedor(a) pode continuar
contribuindo com o ecossistema. Sobre como pode disseminar a cultura
empreendedora.
Além, evidentemente, da possibilidade de ele abrir outro
negócio, existem outros caminhos que ele(a) pode trilhar também.
No meu caso, procuro “irradiar” esse espírito das mais
diversas formas. Por exemplo, dando mentorias na Endeavor, para orientar quem
está passando pelos desafios que passei.
Também costumo ministrar palestras ou
escrever artigos contando histórias e aprendizados, como esses que estou compartilhando
com você. Investimento-anjo é uma vontade futura.
Isso serve até para mostrar ao pessoal mais jovem que
empreender não é um bicho de sete cabeças. Que, por mais que não estejamos no
Vale do Silício ou em Israel, é possível, sim, criar um negócio de valor e com
crescimento de alto impacto aqui no Brasil.
Também tenho a oportunidade de ser professor de
empreendedorismo na PUC-Rio. Dou esses exemplos apenas para mostrar o quanto,
para mim, é forte a causa. E, a meu ver, o momento da venda foi importante
nessa trajetória. Porque, quando empreendedores não são mais os únicos
responsáveis por um negócio, podem se dedicar a outro campo fundamental para as
transformações que todos queremos ver: a educação.
Por último, o investimento em novos empreendedores é uma
bela possibilidade. Que o digam empreendedores como Hernán Kazah, fundador do
Mercado Livre, que hoje se dedica a procurar companhias latino-americanas para
investir por meio da Kaszek Ventures. Ou como Reid Hoffman, co-fundador do
LinkedIn, que também se tornou Venture Capitalist e faz parte do conselho de
várias organizações sem fins lucrativos. Ah, e eles também dão mentorias.
No fim das contas, pode ser que você coloque uma grana no
bolso e queira tirar umas férias. Pode ser, inclusive, que isso te ajude a
“desapegar”. Mas um empreendedor verdadeiramente de alto impacto não dispensa
uma oportunidade de devolver à sociedade. Além dos novos projetos que
certamente surgirão, sempre haverá quem possa se beneficiar da experiência que
você viveu. Não deixe de passá-la adiante!
Por: Luis Vabo Jr é Diretor Executivo da B2W,
Professor da PUC-Rio e Empreendedor Endeavor
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