Há 401 anos um punhado de franceses, à frente Daniel de La Touche Senhor de La Ravardière, desembarcou na ilha de Upaon-Açu para fundar a França Equinocial.
E batizou o lugar de São Luis, em homenagem ao rei Luis IX.
(Foto: JORGENCA)
Seus planos, porém, foram frustrados pelos portugueses que, comandados por Alexandre de Moura, os expulsaram e colonizaram o povoado, imprimindo a marca da sua arquitetura na construção de sobradões com mirantes, de paredes grossas de pedras revestidas de azulejos, com cerca de 3.500 prédios tombados pela Unesco em 1997 como patrimônio da Humanidade.
São Luis nasceu francesa mas cresceu portuguesa. Terra de escritores e poetas, entre estes o vate maior, Gonçalves Dias, a cidade, onde foi editada a primeira gramática do país, ficou conhecida como Atenas Brasileira mas hoje ganhou outro apelido,Jamaica Brasileira, por conta do Reggae, ritmo originário do Caribe que conquistou enorme espaço na ilha, trazendo junto cabelos rastafári e boinas coloridas de crochê.
Ao longo dos séculos a cidade, também chamada de Ilha dos Amores e Cidade dos Azulejos, transpôs os rios Anil e Bacanga e derramou-se para as praias da Ponta d’Areia, São Marcos, Calhau e Olho d’Água, surgindo uma nova São Luis cortada de grandes avenidas e pontilhada de arranha-céus.
A velha São Luis, onde vivi minha infância, ficou espremida entre os dois rios. Às vezes me sento num dos bancos do Largo do Carmo e, refrescado pela brisa que sopra do mar, rememoro os tempos de moleque. E sinto saudades do velho bonde que circulava pelas ruas estreitas e que sumiu sem maiores explicações.
Ainda lembro o garoto que, para escapar do cobrador, raspou o catarro lá do fundo da garganta e cuspiu certeiro no olho do pobre homem. Livre, ele disparou no rumo da rua do Egito. Não sei se entrou na rua dos Afogados, desceu a ladeira do Quebra-Bunda ou escondeu-se no Beco da Bosta.
No meu tempo de estudante no velho Ateneu Teixeira Mendes eu também me esquivava do cobrador para não pagar passagem no bonde, mas outras vezes percorria a cidade a pé, brincava na rua da Inveja e na Praça da Alegria, mas sempre chegava na minha casa, à rua do Passeio, na hora do almoço, onde o arroz de cuxá era quase obrigatório.
Há quem afirme que nas noites de lua cheia, por volta da meia-noite, ouve o trotar dos cavalos e o ruído das rodas da carruagem da lendária Ana Jansen, uma senhora de escravos, percorrendo as ruas estreitas de paralelepípedos.
O vento forte, nos meses de setembro, outubro e novembro, uivando nos becos desertos e soturnos, completa a composição fantasmagórica que assusta crianças e adultos.
Em junho a cidade se transforma num grande arraial, com o ritmo e o colorido do bumba-meu-boi e do tambor de crioula fazendo a alegria dos ludovicenses e dos turistas. Pena que a invasão cultural, facilitada pelos meios eletrônicos de comunicação, já evidenciem sensíveis mudanças na cultura local. E o meu papagaio de criança virou pipa e a bicicleta bike. Seria o ônus do progresso?
Ribamar Fonseca é Jornalista, Escritor e Membro da Academia Paraense de Letras.
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