quarta-feira, 28 de setembro de 2011

O Líder e o Gestor

Os líderes de hoje parecem estar perdidos! Eles olham a paisagem e encontram o seu próprio discurso progressista materializado: um mundo em transformação ao seu redor que gira bem mais rápido do que se possa manter-se em equilíbrio.
Como resultado, suas estratégias parecem ineficientes, inacabadas e suas idéias de mudança parecem não ser mais relevantes, a despeito de toda a experiência no passado recente. Assim, eles vêem a concretização do antigo paradoxo: A tartaruga está sempre um passo à frente de Aquiles!
Fica a impressão que não se tem mais tempo de aprender algo novo, que possa dar um sentido à complexidade das relações sociais e econômicas. A crise crônica dos blocos mundiais é mero sintoma desta cadeia de efeitos. Mas, se reduzirmos o escopo apenas para as organizações, vemos que todo o esforço está sendo direcionado a duas vertentes: redimensionamento (o que inclui o facão do corte de custos e gestão dos tributos) e o esforço criativo para encontrar novas formas de crescer e manter a navegação de seus produtos e serviços “top” indefinidamente.
Contudo, isto também é um fantasma do passado, herança do pós-guerra e a emergência de novos e inesgotáveis mercados, pois o crescimento contínuo, com lucratividade sempre crescente é um ídolo com pés de barro, que já começa a esfarelar, não importando quanto os administradores clamem por planejamento estratégico. O mundo já mudou bastante, enquanto você leu estes parágrafos e não necessariamente para melhor, embora no contexto geral, assumamos a crença de uma macro estabilidade no horizonte futuro.
Mas, como é improvável que o modelo produtivo mude, antes de uma catástrofe qualquer, o caso se encontra na esfera das oportunidades de melhoria. Falta,  portanto reorganizar o que entendemos por gestão e liderança, uma vez que parece claro que os diferenciais competitivos estão migrando para outras instâncias, bem distantes das tradicionais esferas de poder hierárquico-deliberativo.
A internet mudou não somente as comunicações, como também desenhou um novo lay-out cultural, que hoje conhecermos por conectividade. As gerações que nasceram após o boom da web, as conquistas tecnológicas e plataformas de TI,  encontraram um ambiente fértil e criaram novas demandas, antes impensáveis. Em vista disso, as formas de relacionamento são agora fios, redes e teias, a assombrar os que sempre detiveram o poder e manusearam as linhas de força organizacionais. Assim, está parcialmente explicado o porquê da falha das lideranças em cumprir com eficiência seu papel: envelheceram rápido e ninguém mais quer ouvir suas lamúrias, ordens ríspidas ou desgastadas frases de efeito
(des)motivacional.
Como aqui não discutimos como mudar o mundo, mas adaptá-lo, podemos utilizar  o mesmo raciocínio que guia os modelos de gestão de sucesso: – Se as empresas gastam milhões para inovar seus produtos e serviços, tendo em vista o retorno mensurável sobre o investimento, porque a mesma disciplina e abordagem de princípio não pode ser aplicada a liderança? É preciso que as organizações deixem de consultar headhunters para ler a buena dicha  das competências e comecem a ensinar a seus líderes como inovar os seus negócios.
Isto significa, no mínimo, pesquisar as necessidades e desenvolver a habilidades primárias de seus líderes com base nas exigências-foco do mercado em que atuam. Em particular, com o relacionamento junto ao cliente ou público-consumidor e a gestão de ativos e pessoas. Quem não investir na mudança da mentalidade da liderança, perderá em curto prazo suas posições de combate nesta guerra, onde o melhor general é o facilitador criativo da inovação e oportunidade.
A coisa toda é simples! Quantas vezes você encontra líderes no comando de unidades de negócios que não são qualificados para liderar? Isto torna-se  aparente quando vemos que os líderes se esforçam para criar impacto nas linhas de frente e simplesmente não conseguem. Daí vem as desculpas e as acusações. Mas a realidade é outra: Não é possível capitanear uma organização, quando se está a maior parte do tempo enfronhado até o pescoço em gerir suas atividades e  corrigir os erros do segundo escalão.
Por conseqüência temos uma tensão incompatível de objetivos entre liderança e gestão. O segredo não está nos hábitos do monge, mas no que ele faz, efetivamente. Numa organização contemporânea, temos que ter, necessariamente, bons líderes e bons gestores. Pode-se ser um ou outro, parcialmente, mas conforme a situação hierárquica e mercadológica devemos optar por uma das duas posturas ou perde-se a eficiência.
O que é preciso entender está no conceito de desmobilização, ou seja: as organizações devem formar lideranças em todos os extratos da empresa. Isso significa que os líderes de hoje devem abordar o seu dia-a-dia numa estratégia consultiva, onde cada membro da cadeia de comando primária, secundária ou terciária possa agregar valor para o negócio a que servem.
E, portanto, devem ser os responsáveis ​​por contribuir de maneira efetiva a apoiar a inovação contínua e gerir não somente “resultados”, mas a origem dos mesmos, que em última análise vêm das pessoas, tecnologias, processos e gestão do conhecimento. Os líderes devem ser responsáveis ​​por pensar estrategicamente não apenas sobre o seu próprio setor ou departamento, mas também sobre seus clientes internos e externos, num encadeamento sinérgico que vai da sua mesinha no chão de fábrica até os mercados locais e aspectos globais.
As organizações devem deixar de lado os pruridos e preciosismos arcaicos da administração científica e começar a hospedar fóruns de pensamento efetivo em liderança e inovação dentro de todos os setores de suas operações. Devem convidar desde os principais parceiros do supply chain de sua atividade particular, até o mais humilde funcionário. O objetivo é levar os participantes a partilhar as suas perspectivas e recomendações para apoiar os desafios comuns e oportunidades que afetam a todos. É assim que a inovação torna-se orgânica e é criado um ambiente que possibilita o avanço da empresa e da mentalidade cultural colaborativa dos gestores e funcionários.
Hoje os colaboradores querem ser parceiros na liderança de pensamento, e não respeitam mais quem fique ali a dar e receber ordens, muitas delas obtusas e confusas. Eles querem parcerias para permitir o crescimento. E, quando se é parceiro não há medo de exercer sua criatividade e seguir quem é realmente  competente. Clientes querem produtos e serviços com alto grau de qualidade,  garantias e atendimento adequado. Funcionários querem saber por que executam as tarefas e não mais ficar apenas simplesmente a obedecer ou ser mandados embora.
Remuneração decente, também ajuda e deve ser seguida de um sistema de avaliação  justo e a presença contínua do líder em suas rotinas.
Assim, em função das tarefas de gestão e dos inúmeros problemas  procrastinados nas empresas, os líderes têm medo de tomar decisões reais e não  confiam em si mesmos o suficiente para assumir riscos calculados em momentos de  adversidade. Se eles estão alocados na média gerência, então piorou, pois  especialmente no Brasil o personalismo e as práticas de ressentimento dão o tom  da mediocridade que encontramos amiúde por aí. Eles gastam muito tempo tentando  salvar seus empregos, buscando ser politicamente corretos ou agradar aos proprietários e acionistas, deixando de gerir e também de liderar.
Por isso, temos dois momentos ou tipos diferentes com os quais lidarmos: o gestor e o líder. Pode-se dizer que os verdadeiros líderes, ou seja, quem comanda efetivamente a empresa ou unidade de negócios, contam com um bom time de  gestores e esta equipe de gerenciamento, por sua vez, utiliza proporcionalmente de sua liderança, com os subordinados. Mas são efetivamente gestores e devem  tomar consciência disso. Líder é quem direciona para o futuro e o gestor é quem administra o presente, cada qual tem seu momento e sua razão.
É hora, então de os líderes atualizarem seu pensamento e perspectivas,  escapando de uma visão tradicional e uma mentalidade focada internamente nas tarefas e obrigações gerenciais. Os líderes devem ser responsáveis  ​​primariamente para inovar o negócio a que servem, pois a marca pessoal de um  líder deve estar associada a ser um facilitador de inovação e oportunidade para  seus gestores e colaboradores. O velho manda-chuva a quem corremos para segurar a porta do elevador e servimos café com salamaleques, deve ser aposentado.  Formas metódicas devem ser preteridas à flexibilidade de ação e escuta ativa.
Quanto aos gestores, eles devem entender que seu papel é administrar a organização e buscar o escopo de sua liderança dentro dos núcleos internos que falamos, deixando as coisas redondas para que a empresa possa situar-se bem num mercado ferozmente competitivo. Isso inclui ir até o palco das suas operações e conhecer a situação de sua equipe, em outras palavras, significa arregaçar as  mangas e sujar a mão de graxa, se for preciso. Afinal, ninguém respeita um  diretor, gerente ou encarregado que não tem a menor idéia do esforço necessário para se produzir o que se vende e desdenha das opiniões alheias.
Segundo a Fobes, de onde me inspirei para fazer este artigo, liderança, gestão e inovação estão se tornando rapidamente uma commodity e as organizações devem investir na mudança de seus estilos de atuação rapidamente  antes que seja tarde demais. O líder, tal como nós o entendíamos – aquele Sassá Mutema de quem dependíamos e esperávamos vir para salvar a pátria -, numa nova era de conectividade e múltiplas sinergias, pode estar com os dias contados.
Parafraseando Foucault: O Líder pode ser apenas um rosto de areia, que se  desvanece na orla da praia…

Luís Sérgio Lico é Palestrante, Consultor e Educador Corporativo. Doutorando em Filosofia, Mestre em Ética e Epistemologia e Especialista em Gestão Estratégica de Equipes.

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