quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

A Gestão do Luxo: Como compreender a sociedade do excedente

Segundo o especialista no comércio de produtos de luxo Carlos Ferreirinha, o mercado brasileiro é um dos mais promissores entre os paises emergentes, atraindo as marcas mais conhecidas do segmento, do vasto campo que vai dos cosméticos a indústria marítima, o que infelizmente, parece causar um certo desconforto para alguns que ligam a  existência do negócio do luxo a um mero símbolo de opulência. 
Por isso, neste artigo iremos analisar o desejo pelo luxo através de um raciocínio pautado em fatores mais consistentes e a Ética que deve ser agregada a ela.
Devemos compreender que o luxo “é parte integrante da própria civilização”, peça importante de um conjunto complexo de relações entre os membros das sociedades antigas que desejavam ter contato entre si através da troca, exibição ou até destruição (como forma absoluta de poder) de objetos ou bens de beleza e valor incomparáveis. 
A lógica do luxo está ligada a necessidade universal de “acúmulo e de desperdício”, uma vez que, é no dispêndio (de bens financeiros) que o diferencial é notado, que o comum se transforma em algo significativo. 
O interessante (e esta é uma característica básica do luxo), é que em sua maioria ele não terá qualquer utilidade clássica (ligada a sobrevivência) e sim um valor psicológico, que pode ser usufruído individualmente, como também apreciado pelo grupo social.
As suntuosas pirâmides egípcias, por exemplo, são simplesmente túmulos, porém sua grandiosidade ultrapassa sua finalidade meramente mortuária, elas em si, representam muito mais que um enorme gasto de bens e energia humana, motivo pelo qual, se transformaram em algo maior do que sua função primeira pretendia ser, ou seja, as pirâmides são a imagem da exuberância, para além de qualquer finalidade prática de seu uso. 
É dentro destes mesmos padrões, que o luxo se encontra. Quando o filósofo francês George Bataille (1897-1962) se debruçou sobre o assunto, concluiu que o desejo pelo luxo (o  anseio irresistível pelo supérfluo) não é somente uma característica das sociedades, mas também, o possível gerador do desenvolvimento artístico da humanidade, já que, arte e luxo sempre caminharam juntos ao longo dos séculos.

Quando o quadro “Os jogadores de Cartas” de Paul Cézanne foi vendido por 250 milhões de dólares, muitos se questionaram sobre o alto valor da arte em um mundo cheio de desigualdades sociais, porém, o que não foi devidamente compreendido é que a miséria existente em todos os continentes não diminuem o anseio coletivo por uma experiência especial. É exatamente o que nos ultrapassa, ou seja, o que cria um significado diferente do comum, que nos atrai, justamente por ser improdutivo. 
O luxo não é um vilão que se opõe a miséria, ela permanece em seu caminho linear na história humana, diferente da pobreza, que escandalosamente se agravou nas sociedades pós-industriais, impulsionado não pela ascensão dos objetos de luxo, mas pela velha e melancólica cobiça humana. Como bem disse o filósofo francês Voltaire (1694-1778) “o supérfulo é essencial”, a necessidade do supérfluo, sempre nos guiou, como um meio de suplantar o cotidiano maçante e ocultar de nosso pensamento o caminho irrevogável da morte, uma vez que o luxo (ex: diamente) nos oferta uma sensação de continuidade, de eternidade, de libertação do comum.
O luxo foi a possibilidade de exuberância que agrupamentos humanos encontraram para se diferenciarem uns dos outros das mais diversas formas: da criação de objetos preciosos a matança dos mais belos e fortes animais para uma única festa comemorativa ou simplesmente para demonstrar poder através do desperdício para seus adversários. Ainda hoje, a raridade, o exotismo, o designer (a complexibilidade da feitura e da matéria empregada) ainda direcionam o foco do desejo de todo grupo social, em suas diversas camadas. 
Dissociada da necessidade de sobrevivência, a existência do luxo, na verdade, é uma afronta a toda vida útil, e por isso mesmo seu valor redobra, pois está agregado ao símbolo que ele representa, de exclusividade, status e sucesso. 
Obviamente, quando o luxo ganha uma proporção gigantesca (se transformando em um acúmulo desordenado) ou torna-se em algo nocivo para a harmonia social de um povo (ex: os diamantes de sangue de Serra Leoa) ou ainda, ameaça a preservação do meio-ambiente, o luxo pode torna-se em algo realmente corrosivo e prejudicial, por isso, tal como outros tantos negócios, ele terá que se ajustar a um mundo que passa por uma auto-analise ética e quer reverter hábitos antigos que não nos conduziram a harmonia.

Se no mundo antigo a suntuosidade era próprio das grandes instituições (em um misto de política e religiosidade), hoje, o luxo deve ser compreendido em sua totalidade:  em sua matriz ética, histórica, psicológica, social e mercadológica de tal forma, que possa ser gerenciada com todo cuidado e delicadeza que merece, uma vez  que é o mercado que cresce 33% ao ano em paises como o Brasil. Mais que administrar um negócio, o gerenciador do luxo, tem que saber equacionar desejos.

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