Vamos combinar: não
há “nada” de errado com a Geração Y.
Ou, melhor dizendo,
não há nada ESPECIFICAMENTE ERRADO COM A GERAÇÃO Y, que não tenha também suas
correspondências em outras gerações.
Fato #1: virou moda
falar mal da Geração Y.
E, desse ponto em
diante, é tudo opinião, tendo você todo o direito de se importar com ela ou
não.
Pra contextualizar é
importante que você saiba: nasci exatamente na virada da geração X para a
geração Y. A X achava que eu era Y, e a Y achava que eu era X.
Posição difícil, pode
apostar.
Nessa situação, você
estará sempre deslocado, não importa que posição tomar. E, se tentar defender
uma para a outra ou vice-versa, vai brigar com as duas partes.
Palavra de um XY de
nascença
Se é assim,
inevitável, então fica decretado para mim mesmo que não vou escrever com o
intuito de agradar ninguém.
Já saio perdendo, de
qualquer forma. Também não vou escrever para ser fofo ou repetir os mantras que
a galera quer ouvir. Parece que virou senso comum nos blogs e afins: seja fofo,
ganhe recomendações e seguidores. Valeu Eden Wiedemann pela inspiração: mais vale uma dose de franqueza
que seguidores de ocasião. Você não falou isso, mas foi o que eu entendi de
seus posts recentes.
O fato (ok, é meio
forte falar “fato” logo depois de dizer que é tudo opinião, mas o filtro é com
vocês!) é que não aconteceu nada de errado com a Geração Y.
Nada.
Ou, pelo menos, nada
mais nem nada menos errado do que eventualmente tenha acontecido de errado com
a Geração X.
Aposto, também, que
com a Z não vai ser diferente. Talvez seja um “pouco mais acelerado”, mas a
gente se acostuma.
Quero deixar bem
claro que essa não é uma resposta direta ao post do Ícaro de
Carvalho, super bem elaborado e contundente.
Afinal, nenhum post
chega a quase 4 mil recomendações (e contando) se não for significativo. O
garoto é bom, decerto não precisa da minha aprovação (e de mais ninguém) e já
deu mais de uma prova disso.
Mas minha visão sobre
esse assunto é um pouco diferente. Questão de perspectiva.
Parem de glorificar
ou desqualificar a Geração X. Tá feio.
Pra começar, vamos
falar um pouco dos nossos pais, Baby Boomers tardios ou membros iniciais da
Geração X.
Se você conviveu com
alguém dessa época, é grande a chance de você ter convivido com alguém que
ralou muito. Que ia pro trabalho de transporte público ou em um carro sem ar
condicionado, de janelas abertas.
Que não parava várias
vezes ao dia para fumar (aquela estratégica escapadinha ao fumódromo), até
porque quando fumava, fazia na própria mesa. Era cool.
Que fazia, sim,
“serão”. Porque se levasse trabalho pra casa, talvez não tivesse as ferramentas
(você acha que sempre tivemos ferramentas até melhores que as do ambiente do
trabalho nas nossas casas?) ou todo o arquivo pra consultar (daqueles pesadões,
de metal, com as letras nas gavetas e pastas suspensas?).
Que não tinha Google,
Dropbox, email, celular e várias dessas parafernalhas que até hoje a gente não
sabe se ajudam ou se atrapalham nosso dia a dia.
Tá, ajudam. Melhor
diminuir a polêmica.
Uma geração que tinha
muito trabalho a fazer, na agência, no escritório, na repartição, onde quer que
fosse.
Até porque nessa
época também se construíam prédios, faziam-se operações bancárias,
desenvolviam-se softwares e realizavam-se neurocirurgias, além de dezenas de
outras coisas sofisticadas.
E, talvez por isso,
vi muitas vezes meu pai trazer pastas e pastas do trabalho. Ele fazia jornada
dupla. Era professor e empreendedor (tinha uma pequena gráfica onde fazia de
quase tudo — da venda ao design, da produção gráfica ao
acabamento). Algumas noites eram dedicadas à correção de provas e lançamento de
notas, outras trabalhando na arte final (com aqueles decalques ou fazendo transposição de imagens como
papel digital) de algum trabalho da gráfica. Aprendi muito vendo ele trabalhar.
Era uma galera que,
sim, só tinha meia dúzia de canais na TV, que ficava anos no plano de expansão
da Telerj (ou equivalente) para conseguir uma linha telefônica, que só podia
beber Antártica, Brahma e Kaizer (ou alguma cerveja de baixa qualidade parecida),
que financiava o apartamento em 30 anos na Caixa (com o saldo devedor
aumentando, por mais que pagasse as prestações) e que andava em carros que hoje
a gente chamaria de carroças. Que ralava pra cacete, muitas vezes dedicando 30,
35 anos a uma mesma empresa. E muitas vezes ao mesmo chefe.
A vida profissional
“acabava” aos 40
Lembro também do
desespero de amigos do meu pai ou pais de amigos que perderam “o emprego da
vida” perto dos 40 anos.
“Ninguém contrata
ninguém mais velho que 40 anos”, eles diziam. E eu acreditava. Até porque não
tinha Uber pra salvar. E economia colaborativa era pedir ajuda ao amigo pra
pagar as contas no fim do mês, enquanto o bico ou o novo emprego não vinham.
Hoje eu tenho perto
disso (ok, faltam alguns anos, mas chego lá em breve), e “desemprego” é algo
que nem de perto me aflige. Até porque é cada vez mais fácil viver “sem
emprego” e sem chefe.
Geração perdida é o
cacete!
Aí vem alguém
vaticinar que a Geração Y é uma Geração perdida.
Que deu errado. Que a
culpa é do diabo! (Foi mal, Ícaro, não é pessoal. Foi só uma referência).
“Uma geração que dá
sua vida por uma empresa que enche seu saco 24 horas por dia, que finge criar
um lugar legal pra trabalhar e que dá pizza e cerveja pra quem trabalhar até
mais tarde”.
Vamos falar sério?
Esses tais de “Y” são
espécimes de 30 e poucos anos que vão viver até 120, 150.. Que vão ser
produtivos por muitas e muitas décadas. Ou até mais, quando vier alguma
disrupção na longevidade humana que supere o que representaram a penicilina e o
marcapasso.
Terapias genéticas?
Substituição de órgãos? Backup do cérebro? Não importa, elas virão.
O Jogo nem começou
E aí o “titio” aqui
(podem me considerar um primo mais velho, dada a pouca diferença de idade) vai
contar um segredinho pra vocês. O jogo nem começou. Até aqui foi no modo easy. Era só aquecimento. Trailer. Amostra grátis.
Foram quase 20 anos
de bonança. Farra das commodities. Pleno emprego, onde qualquer indivíduo
medianamente formado conseguia uma posição no mercado. Onde saber ligar o
computador já contava pontos para trabalhar em TI. Um período no qual as
empresas queriam ser “as melhores para se trabalhar”, pois precisavam se vender
a vocês (a nós, no caso). Muitos dizem que isso moldou uma geração que se acha
“merecedora”, que age como “bebês”.
Bora mudar o jogo
Eu não concordo. Acho
que ainda tem jeito.
Mas a farra tá
acabando. Ou a gente muda o jogo, como bem defende o Gustavo
Tanaka, ou vai ser complicado se divertir e vencer.
Esse jogo, desse
jeito, com essas regras e com essa mecânica, tá complicado.
A vantagem é que, de
um jeito ou de outro, vocês (nós) moldaram competências que vão salvar vocês
(nós) daqui pra frente. Sabe-se lá por que, mas eu falo disso mais adiante.
Trabalhar por muito
tempo não é trabalhar o tempo todo
Outro ponto que eu
quero falar antes é sobre a crítica “a dedicação extrema e as horas extras”.
Vamos fazer uma
análise? Pega um dia de trabalho seu, típico.
Toda vez que você
parar pra fazer alguma coisa fora do escopo do trabalho você anota (eu faria no
papel, de repente você faz no EverNote, ou qualquer outra geringonça online que
eu não conheço).
Facebook, SnapChat,
consultar o email pela décima-quinta vez naquela mesma hora, WhatsApp, Jornal
Online, Spotify…
Você diz.
A gente trabalha
muitas horas, mas poucas são efetivamente produtivas.
Sério. Sejamos
honestos. Nos falta foco.
Sim, você pode
processar muitos canais ao mesmo tempo, muito mais do que a geração anterior.
Mas foco continua sendo importante, baby. É físico-bio-químico. Seus neurônios,
se mudaram, não mudaram tanto assim.
É claro que você tem
que ter vida. E qualidade de vida. E vida social. E mais vidas no Candy Crush,
no Angry Birds ou.. Sei lá, cara, algum jogo da moda.
Eu só entendia de
Mario e Tetris, facilita a minha vida. Você entendeu. Você precisa de uma vida
fora do mundo corporativo.
O problema é que ela
tá toda misturada com seu dia a dia de trabalho.
E agora, como é que
separa?
Pois é, não separa.
Ou, pelo menos, não separa mais.
Não é bom, nem ruim.
É um fato.
Trabalhamos 8, 10, 14
horas? Mas às vezes demoramos muito mais para entregar essas mesmas horas do
que nossos pais demoravam.
Temos que parar de
pensar em horas e começar a pensar em impactos
Ainda dá tempo.
A questão, no
entanto, é que nada disso é catastrófico, mortal ou destruidor como querem
vender. Tem seu lado bom.
Então, que
competências da Geração Y que vão salvá-la, enquanto há tempo (e muito, por
sinal)?
- É uma geração que sabe colaborar e construir coletivamente como nenhuma outra.
- Que desconstrói, desapega e reconstrói com mais facilidade.
- Que domina a tecnologia e celebra a diversidade.
- Que não sabe diferenciar o digital do real, até porque não precisa (mais).
- Que faz. É hacker, é maker, é taker e baker.
- Que tem resiliência e flexibilidade, porque se acostumou a viver em constante mudança.
- Que tá aprendendo a aprender e aprendendo a empreender.
- E que, ao empreender, consegue fazer de forma holocrática. E em rede.
- Que, inspirada nos videogames, não tem problema em dar o reset ou trocar o jogo.
- É uma geração que é ela mesma. Sem filtros.
- É, talvez, a primeira geração realmente inspirada por propósitos.
- Uma geração que valoriza a qualidade de vida, a saúde, a vida social, as conexões… Mesmo que alguns queiram descaracterizá-las pelo fato de serem predominantemente eletrônicas ou virtuais.
A verdade é que não é
coisa de uma geração ou outra.
O mundo, em geral,
que tá uma bagunça. Volátil, incerto, complexo, ambíguo.
Empregos que pareciam eternos desaparecem a cada
dia. E outros, surgem.
Pessoas trocam de empresa com cada vez mais
frequência. E de carreira. E até de vida!
Cinco ou seis gerações estão convivendo por aí, ao
mesmo tempo. E esse número vai crescer.
Inovações disruptivas aparecem a todo o instante.
Ninguém está a salvo. Ainda bem.
E são vocês, os caras
da geração Y, os únicos capazes de articular tudo isso.
Os membros da
Geração Z tão chegando, e daqui a pouco vai ser hora (errada) de falar mal
deles.
Aperta o play!!!
Por: Daniel Orlean - https://www.linkedin.com/pulse
Nenhum comentário:
Postar um comentário